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No indulto a Daniel Silveira, o STF não é mocinho

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O indulto concedido por Bolsonaro ao deputado Daniel Silveira tem previsão constitucional e a possiblidade de sua relativização pelo Judiciário é questionável. A alegação de violação do dever de impessoalidade ou de abuso de poder na concessão da graça soa muito mais uma saída política do que jurídica para a crise histórica em que se encontra a Suprema Corte do país.

Mas, acreditem, o Supremo se valerá de qualquer fundamento para desfazer a medida de Bolsonaro. Há muito tempo deixou de haver constrangimento em se julgar politicamente um caso, e o STF na atualidade está mais preocupado em mostrar sua força, quem manda mais.

Daniel Silveira, por sua vez, não é uma vítima, o deputado ameaçou ministros e ameaçar não merece proteção da liberdade de expressão, tampouco resguardo da imunidade parlamentar. Não interessa se o que disse Silveira é crível ou não, punir a ameaça é evitar uma potencial lesão a um direito, não é um exercício de vidência.

No entanto, o STF condenar o deputado a inimagináveis nove anos de prisão em um inquérito kafkiano, com medidas heterodoxas para dar e vender, é justificável apenas a quem acredita no pensamento mágico de que o Tribunal defende com pureza a democracia. Essa não é uma crença menos ingênua que a dos que enxergam em Bolsonaro e no deputado Daniel Silveira os cavaleiros da cruzada pela liberdade de expressão.

Não é preciso ser expert em Brasil para saber que, por aqui, desde Cabral as instituições se curvam e se submetem aos indivíduos, servem a quem deveria por dever servi-las. Os investidos em cargos públicos se ocupam mais da preservação de seus interesses e do interesse dos seus do que da democracia.

Mas há uma diferença importante, caros leitores. Bolsonaro e Daniel Silveira quando fazem política estão no seu papel, são políticos. Quando o Supremo faz política está fora da sua função. Legitimarmos com nosso aplauso e crença essa estranha tarefa da Suprema Corte é abrir um precedente para que ajam como bem quiserem e sem nenhuma estabilidade jurídica.

Não à toa, assistimos à Lava Jato ser referendada pela Suprema Corte em um dia e, mudados os interesses em curso, soterrada no outro. Não à toa, assistimos à prisão em segunda instância ser considerada constitucional em um dia e, mudados os personagens do tabuleiro, considerada um abuso no outro.

O Supremo Tribunal Federal não defende a democracia quando faz política, mas quando exerce a interpretação da Constituição Federal com técnica. Essa é a função constitucional atribuída à Corte, e cuidar de exercê-la é o que de mais democrático ela pode fazer por nós. Claro, se desse imbróglio todo sobrar alguma democracia.

Publicado na revista Crusoé.