Com o tempo, ministro se transformará em um prático que, na esteira dos demais, decidirá o que for necessário para lá se eternizar, escreve André Marsiglia
Caro leitor, ponha os óculos e leia com atenção o que escreverei a seguir. Os votos do Zanin serem assim ou assado não têm absolutamente importância nenhuma. E a razão é bem simples: não existe ministro conservador ou progressista no STF (Supremo Tribunal Federal). Os ministros só têm um lado: o deles.
Eu morro de rir –mas, na verdade, deveria chorar– quando alguém diz que determinado ministro é petista ou bolsonarista, de direita ou de esquerda. Não são e eles diariamente nos dão provas e mais provas disso.
Ministros do STF, mesmo quando agem politicamente, não o fazem em favor deste ou daquele partido, desta ou daquela ideologia política. Se fossem obrigados a ter algum partido, certamente seria um daqueles de centro, que se dão bem com todo e qualquer personagem que está exercendo na ocasião o poder.
Não se conduzem desta forma por qualquer outra razão que não seja a de assegurarem o exercício calmo e tranquilo de seu próprio poder. Bolsonaro só se transformou em um vilão de desenho animado para a Corte depois de reiterados bombardeios severos aos ministros. Ainda assim, depois de inúmeras tentativas de aproximação de enviados em missão conciliatória com o ex-presidente.
Quando Lula sangrava em praça pública durante a Lava Jato, os ministros que lhe davam pedradas são os que agora lhe enviam afagos. Os que agora dão pedradas em Bolsonaro são os que talvez amanhã lhe enviem sorrisos. Como diria Augusto dos Anjos: “a mão que afaga é a mesma que apedreja”. A mão do poder não tem ideal, tirante o de se agarrar onde for preciso para seu próprio fortalecimento.
É desta forma que funcionam os poderes da República no Brasil, e com nossas Cortes não seria diferente, caro leitor. Não sejamos tolos de acreditar que preferências por este ou aquele político, por esta ou aquela corrente ideológica, sejam significativas ou decisivas na hora de se tomar uma decisão judicial que impacte na vida do país. Ocupar o cargo de ministro de uma Corte como o STF, que tem um poder descomunal de moderar os demais poderes e fiscalizar a ordem e o debate público, requer pragmatismo.
Quem é capaz de hoje em dia separar os ministros do STF em progressistas e conservadores sem apagar seu rascunho infinitas vezes? Se por convicção ideológica ou desejo de se mostrar independente, Zanin proferir votos progressistas ou conservadores, respire e aguarde, caro leitor, tanto uma quanto outra postura serão provisórias. Arroubos da juventude do cargo. Entusiasmos de principiante.
Aos poucos se amolda à cadeira, ajusta-se à toga, acostuma-se ao grupo. Então será engolido e se transformará em um prático que, na esteira dos demais, decidirá o que for necessário para lá se eternizar, governando sobre nossas cabeças e a despeito de todas as nossas vontades.
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