0

O Big Brother do STF

Decisões, fatos, provas e nomes têm sido expostos em momento e formato estratégicos, de acordo com a conveniência da Corte, escreve André Marsiglia

Não faz o menor sentido que uma democracia se leve a sério e tenha inquéritos excepcionais completando 5 anos de existência, como ocorrerá com o das fake news, na 5ª feira (14.mar.2024). Na verdade, não se trata de um, mas de 8 inquéritos que orbitam em torno do Supremo Tribunal Federal, como tentáculos em torno de um polvo.

Fui o 1º advogado a atuar nos inquéritos, à época, defendendo a revista Crusoé da censura que lhe impunha a Corte, e posso garantir que não se trata de tarefa fácil: tudo sob sigilo e o direito das partes relativizado a todo tempo.

Em setembro de 2023, quando as provas da delação da Odebrecht foram anuladas pelo ministro Dias Toffoli, escrevi o artigo O STF editou a história do Brasil. No texto, explicava que o tribunal se respaldava na força de suas decisões para virar o editor geral da nação. A conduta não ficou restrita apenas a esse episódio e os ministros passaram a se utilizar de um recurso mais sofisticado: o sigilo imposto a seus inquéritos.

Mas como não estariam, ministro, se o quebra-cabeças é feito no escuro, sob o sigilo imposto a tudo pelo próprio STF? Se a Corte se compadece, agora, com a veiculação de informações incompletas a ponto de levantar o sigilo, por qual razão, afinal, as colocou antes? Se, agora, podemos, por que antes não podíamos ver documentos aparentemente tão relevantes?

Parece que estamos no meio de uma dessas gincanas em que se torna pública uma decisão ou trecho, como uma espécie de petisco à audiência. Parte da imprensa, como se estivesse disputando a prova do líder, desejando agradar, trata a informação como um troféu e a carimba como válida e suficiente. Quando alguém mais crítico a questiona, mostrando sua fragilidade, liberam-se mais documentos, mais decisões, informações mais contundentes, como no caso da última semana.

Uma outra vertente do Big Brother do STF são os recados que chegam dos ministros pela imprensa. Uma espécie de voz do big fone que apenas alguns jornalistas eleitos podem ouvir, anunciando os próximos passos do jogo. O mais pitoresco big fone até agora foi o recado de um ministro afirmando que se Bolsonaro, nas manifestações de 25 de fevereiro, dissesse um “ai” a respeito do Supremo, seria preso. Ou melhor: posto no paredão.

Nossa República virou um Big Brother. Um Estado democrático do entretenimento, não mais do Direito. Como ratinhos de laboratório em meio a um experimento social, vivemos, comemos, dormimos e acordamos ao sabor dos estímulos e desestímulos que nos são dados pela Corte. E tanto o Big Brother televisivo como o do STF, mesmo com o passar dos anos, e apesar da impaciência da população, nunca acabam.