Na semana que passou, Nicolás Maduro apareceu como apresentador de um programa bizarro na televisão da Venezuela, o “Con Maduro+“. Durante sua exibição, anunciou a Sira, uma apresentadora digital, que teria sido criada sob parâmetros de inteligência artificial para o auxiliar na atração.
Como bem observado pelo professor Gustavo Macedo, do Ibmec, em excelente reportagem de Duda Teixeira para Crusoé, não há como saber se a Sira formula suas próprias respostas ou se há alguém por trás dela, digitando o que lhe sai da boca, algo semelhante a uma ventriloquia digital.
Isso porque não houve interação espontânea entre Sira e Maduro. Ao conversarem, fica evidente que estarmos diante de uma participação pré-gravada da personagem que, diga-se, abre a boca apenas para proferir elogios. “Triunfaremos”, sentencia a moça-robô, ao final de suas falas, imitando a palavra de ordem da propaganda de Maduro. Como se vê: de inteligência, nada. De artificial, tudo.
A intenção de Maduro não foi expor as ideias de Sira, mas expor a seu público que a Venezuela é avançada, não ficando para trás de países pertencentes ao eixo tecnológico do mundo. Claramente, trata-se de uma inverdade, mera propaganda de quinta categoria. Mas, bem ou mal feita, Maduro chama a atenção com sua bala de festim tecnológica. Por mais grotesco que sejam tais aparições, na sociedade do escândalo em que vivemos, tudo sempre causa algum efeito, gera alguma mídia que, cedo ou tarde, pode ser usada.
A Venezuela de Maduro não é precursora de nenhum feito tecnológico. Maduro não entende nada do assunto. Entende de censurar, e nisso sai na frente ao se tornar o primeiro governante a cometer censura prévia contra uma inteligência artificial. Impor à imprensa comentários editados e pré-gravados, sem nenhum lampejo de espontaneidade, é algo que, sem dúvida, o governante está acostumado a fazer, mas com robô é uma novidade.
Pode parecer pitoresco falar em censura à inteligência artificial partindo do exemplo de Maduro, mas, não demora, teremos pipocando projetos de lei e medidas do Executivo tratando da necessidade de a inteligência artificial ser controlada para não promover discurso de ódio, desinformação, fake news. Como tais conceitos são passíveis de interpretação, medidas precipitadas, ou tomadas por governos ideológicos, seriam capazes de manipular ideologicamente a inteligência artificial, que aprenderia apenas o que interessa a determinado grupo.
Maduro, diante do avanço tecnológico, dá o primeiro passo em direção à censura da inteligência artificial, por consequência, ao atraso. Vejamos como o Brasil se comportará. A tendência é que siga à risca as lições tomadas com o país vizinho. Talvez por aqui não nos comportemos de forma tão escancarada, mas, com esforço, podemos chegar lá. Triunfaremos!
Publicado na revista Crusoé.