Na semana passada, veio à tona o caso envolvendo a divulgação pela imprensa de informações delicadas e sigilosas da vida íntima da jovem atriz Klara Castanho. Ela própria, na sequência, pôs luz aos fatos com uma carta aberta publicada em suas redes sociais.
Os pormenores do episódio são de uma tristeza só e não precisam ser aqui lembrados, mas mostram o quanto ainda estamos na idade da pedra no que importa à dor alheia. O quanto ainda são precárias as nossas políticas de sigilo e, sobremaneira, o quanto a vítima acaba sempre recebendo a maior carga de todo o impacto midiático gerado por casos como esse.
Tudo o que for dito, por qualquer um, mesmo as manifestações mais solidárias, acabarão expondo ainda mais a intimidade da atriz. Assim funciona, hoje em dia, nosso mundo. Por essas razões, pensei bem se deveria ou não escrever esse artigo. Mas como é minha função tratar de temas relacionados às liberdades de expressão e seus limites, não posso deixar de compartilhar com os leitores algumas reflexões.
De saída, claramente houve excesso na divulgação dos fatos que atingiram a atriz, foram transpostos os limites da liberdade de expressão. Mas por qual razão? Muita gente diz que jornalismo de celebridades não é jornalismo, que não é algo digno, que não recebe resguardo da liberdade de expressão por não possuir interesse público. O próprio judiciário se posiciona quase sempre de forma muito crítica e rígida quando aprecia processos judiciais que tratam desses temas. O que não é de forma alguma correto.
Obviamente, o jornalista não possui um cheque em branco para escarafunchar a vida íntima de alguém, expondo fatos sensíveis e delicados confiados ao sigilo, como no caso da atriz. Por isso os limites da expressão foram violados. Mas a mera curiosidade das pessoas, motor do jornalismo de celebridades, goza de interesse público.
Se alguém entrar gritando no meio de um shopping center e isso for noticiado, a publicação será legítima. Se um grupo de pessoas sair pintado inteiramente de azul nas ruas de qualquer cidade e o fato parar nos jornais, não haverá qualquer problema para o jornal.
Interesse público, como justificativa para receber a proteção da liberdade de expressão, não pode ser um punhado de coisas consideradas nobres por uma elite intelectual ou jurídica. Isso seria dar a esse direito fundamental uma interpretação aristocrática e restritiva, o que não foi, de jeito algum, a intenção do legislador.
Manifestar-se sobre celebridades é tão protegido quanto sobre qualquer outra pessoa, esse gênero é tão jornalístico como qualquer um. Não há nada de errado com o jornalismo de celebridades. Não existe jornalismo melhor ou pior, mas jornalistas que se comportam eticamente, calçados no interesse público, e agem licitamente, e os que não, independentemente do assunto abordado.
Publicado na Revista Crusoé.