Mídia tradicional sempre teve plataformas digitais como pedra no sapato e é sedutor ser considerada a única séria pela Suprema Corte, escreve André Marsiglia
Nos eventos realizados na 2ª feira (8.jan.2024), ao defender o PL 2.630 de 2020, das fake news, o ministro Alexandre de Moraes disse ser preciso proteger a “imprensa séria”. Por óbvio, também dava a entender que uma imprensa considerada “não séria” mereceria ser combatida.
Não é a 1ª vez que o ministro usa essa expressão para se referir à imprensa. Em manifestações anteriores, deixou inclusive claro entender por sinônimo de séria a imprensa tradicional.
O que o ministro deseja é riscar o chão, colocando do seu lado da trincheira a imprensa corporativa e, do outro, em uma espécie de limbo, os sites e perfis amadores surgidos e habitados exclusivamente nas redes sociais. Feito isso, os Tribunais Superiores poderão seguir sua narrativa de que travam uma batalha moral para devolver à sociedade a virginal verdade e a seriedade que as redes sociais nos teriam tomado de assalto, quando, na prática, o que fazem é controlar o discurso das redes sociais, censurando-o.
As mídias tradicionais sempre tiveram os sites e perfis amadores como uma pedra em seus sapatos, e não deixa de ser sedutor serem consideradas por nossas potentes Cortes parte de uma imprensa séria, portadora da verdade. É mais sedutor ainda a tais mídias saber que a regulação das redes sociais intenciona obrigar que big techs remunerem a imprensa considerada séria pela utilização de seu conteúdo. Tantos fatores em conjunto explicam a adesão de parte da imprensa corporativa à aprovação do PL das fake news.
No entanto, o recente caso da tese fixada pelo STF para responsabilizar a imprensa por declaração de entrevistado ou fonte deveria ter deixado claro que a Corte, quando convém, usa contra a imprensa tradicional a mesma agressividade com que trata as redes sociais e seus usuários.
Esse fato deveria ter servido de lição e deverá servir de alerta de que, mídia tradicional ou não, se e quando desagrada os interesses das Cortes, será tratada na força bruta. E se há uma coisa com a qual os críticos do PL das fake news concordam é que as subjetividades do projeto autorizam o cerceamento da liberdade de expressão. O pau que bate em Chico acertará Francisco; a censura que atinge as redes acertará a imprensa. Só não vê quem não quer.